Girl From Sao Paulo

"you are crossing the tropic of capricorn".

17 February 2007

A filosofia de “se dar bem”

Pequeno Helio morreu da forma mais bárbara que se pode imaginar arrastado pelo asfalto das ruas do rio de janeiro. Sempre que me lembrei do caso estes dias, foi com profundo pesar pelo sofrimento de seus ultimos momentos e pela barbárie que sua familia vivenciou. Meus sentimentos não são originais porque este crime em particular tem comovido nossa nação, em todas as facetas possiveis.
Sua familia foi destruída - sem reparo. Mesmo após a captura dos responsáveis.

Mas onde estão as raízes de um crime deste porte? Tenho certeza que os familiars de cada um dos meninos que foram presos tentou passar a eles valores morais e éticos. Nenhum pai, por mais omisso que possa ter sido (e eu não conheço os pais em questão, nem tenho acho que importe) imaginou que seu filho tivesse capacidade de atos tão violentos. Não entendo de criminologia, mas os garotos em questão não são psicopatas. Eram rapazes como tantos que cruzamos por aí. No entanto, eles optaram por não parar o carro, optaram por não evitar a tragédia andando com o carro em ziguezague para se desfazerm do corpo e assim se livrarem da responsabilidade. Entre parar o carro e arriscar a prisão salvando o garoto, eles tomaram medidas radicalmente crueis para TENTAR escapar.
Eles tentaram “se dar bem”.

Fica a pergunta: será que as sementes desta falta de ética e moral não são prevalentes de forma promiscua em nossa sociedade, onde admiramos os que “se dão bem”?

A construtora de obras publicas que compromete a segurança dos cidadãos trocando materiais de qualidade por outros mais baratos para “se dar bem” não é tambem um pouco culpada?
O vendedor da feira que “se dá bem” empurrando o produto vencido não é tambem um pouco culpado?
O motorista que ignora um sinal vermelho “se dando bem” sem levar multa não é tambem um pouco culpado?
O cidadão que “se dá bem” sonegando impostos não é tambem um pouco culpado?
O vereador corrupto que “se dá bem” sem ser cassado não é tambem um pouco culpado?
Aquela senhora no congresso que fez a dancinha da pizza quando seus amigos ‘se deram bem” não é tambem um pouco culpada?
A pessoa que compra dvds pirata e se “dá bem” pagando menos não é tambem um pouco culpada?

O conceito de ética se destroi em pequenas doses, nas decisões menos obvias que precisamos tomar a cada dia. Imagine-se devolvendo mercadoria que lhe foi entregue duas vezes por equivoco. A pessoa que devolve o troco errado, e respeita o espaço publico é tida como trouxa.
Uma criança que aprende a cuspir chiclete no chão, vê seus pais furando fila no supermercado, e escuta a história da propina que seu pai recebeu, aprende que precisa ignorar a ética e que ela pode ser maleável de acordo com o sentimento justiceiro de cada um. Ela aprende a se isentar de responsabilidades morais quando percebe que o governo a deixou de lado, prometendo uma escola que não sera entregue. Se a pessoa não tem respeito pelo próximo e não respeita as leis de convivência, ela não é ética.
Não há como ver as coisas de outra forma, na minha humilde opinião. Para uma sociedade justa, cada cidadão tem de fazer a sua parte, por menor que ela seja.

Então, eu acho que de certa forma, todos nós habitantes desta sociedade eticamente maleável somos um pouco responsáveis pela morte de nosso pequeno Hélio.